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quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Visão

Quando eu era pequeno, entre 5 e 10 anos, morava em uma pequena cidade do interior. Mas o que me importava mesmo, era passar as férias na casa de meus primos. Eles moravam no último andar de um prédio na cidade grande, e eu adorava ficar lá em cima, olhando para a rua, entretanto, daquela época só me lembro de uma coisa: a banca de jornal da calçada.

A cidade era bonita, as pessoas eram bonitas, tudo na cidade grande era diferente. E sempre que eu podia, e tinha dinheiro, descia até a rua para comprar alguma coisa na banca. Descia feliz, subia feliz. A cidade grande era muito boa.


Os anos passavam e a cidade não mudava, continuava bonita, perfeita, com sua cheia banca de jornais na base. 

Mais alguns anos passaram, fiquei muito tempo sem ir aos meus primos, e das vezes que fui, percebi que as coisas estavam diferentes, a cidade estava escura e suja, com pichação. Nunca havia visto nenhuma por lá antes. A banca também não estava mais lá, mas eu sempre estava com pressa, não dei atenção.

Finalmente com as voltas do mundo encontrei-me morando com meu primo, e na primeira noite em claro, olhei pela janela da madrugada. A noite estava laranja, sozinha, e percebi como há muito tempo antes, que a banca não estava lá, mas dessa vez, a imagem me desceu pelo trato digestivo, fria e pesadamente chegando à minha consciência. Pela primeira vez na vida, notei que a cidade sempre fora suja e escura, e que a visão da banca de jornal é que mascarará tudo aquilo que eu tinha visto por anos. Consegui lembrar que quando descia para ver revistas, atrás da banca, havia as paredes pichadas, e atrás das paredes pichadas uma série de coisas que até hoje nem posso imaginar. Parei para pensar que talvez, isso signifique que minhas lembranças de infância não foram tão coloridas quanto eu achava que eram. E com isso, talvez eu pudesse parar de comparar meu presente descontrolado com um passado idealizado, visto pelos olhos de uma criança distraída. Tomei consciência naquele momento que era um adulto e que a frieza do mundo se esconde na falta do que algo que podemos chamar de nossa banca de jornal nos faz. 


(Victor Marin)

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